terça-feira, 26 de novembro de 2013

AgroANALYSIS: Pecuária de Corte rumo à Sustentabilidade



Estive na feira de Anuga [Alemanha] no final de setembro. A exposição é uma das maiores mostras mundiais, senão a maior, de alimentos e bebidas. Estiveram presentes cerca de 6,7 mil expositores de quase 100 países. O Brasil esteve muito bem representando por mais de 70 empresas, que juntas fizeram negócios da ordem de US$ 1,1 bilhão, apontam dados da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil).

O Brasil expôs diversos produtos, de biscoitos, balas e chocolates, passando por sucos, castanhas, cachaça, vinho, chegando às carnes [bovina, suína e de frango], num verdadeiro “road show” da indústria agroalimentar brasileira para o mundo.

A avicultura participou com 16 empresas numa área coordenada pela União Brasileira de Avicultura (Ubabef). A carne bovina marcou presença com 15 empresas sob a batuta da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec). Por sua vez, o setor de carne suína participou com três empresas. A mensagem-chave disseminada foi de que a carne brasileira tem os atributos de qualidade, segurança sanitária e sustentabilidade, tudo isso embalado em um conceito de marca “Brazilian Beef”. Outro destaque foi a indústria brasileira de suco de laranja, em esforço institucional, comercial e de marketing liderado pela Associação Nacional dos Exportadores de Sucos Cítricos (CitrusBR).

E é com base nesta experiência que quero fazer uma reflexão acerca da organização das cadeias produtivas, agregação de valor e alinhamento entre produção e anseios do consumidor.

O relacionamento das cadeias produtivas agrícolas é conflituoso por natureza. Se no universo das commodities, as cotações em bolsa balizam as negociações, em outras áreas, como, por exemplo, das carnes, o cenário é diferente. Os critérios são mais amplos, tênues e, justamente, por serem menos claros geram discussões. Contudo, sempre impera o quadro de que o fornecedor quer que o seu produto seja mais valorizado, e o comprador vai barganhar sempre, a fim de pagar menos.

Entretanto, esta é uma questão que precisa ser debatida dentro do setor, com a criação de mecanismos que deem transparência e objetividade à remuneração dos fornecedores. E por que separei este ponto? Porque o que vi em Anuga foi um belo exemplo de como o produto agrícola brasileiro pode ser vendido de maneira mais competitiva, por meio de uma organização profissional, que explora a agregação de valor.

Sob o guarda-chuva das entidades agroindustriais, os frigoríficos e as indústrias de suco deram show, funcionando com um cartão de visitas para o produto nacional. Esta organização do setor agroindustrial tem que servir de exemplo para o setor primário, para os produtores “descomoditizarem” sua atividade e assim assumirem um patamar mais elevado e diferenciado em seus negócios.

Claro que há o desafio do “Custo Brasil”, do acesso a tecnologias, das exigências socioambientais cada vez mais duras, das mudanças que gradativamente alteram a dinâmica do setor produtivo. As megafazendas são as protagonistas da produção de commodities hoje, e os pequenos contam com apoio estatal para migrarem da subsistência para agricultura de mercado. Todavia, ao cumprirem esta etapa estarão sujeitos aos mesmos desafios enfrentados pelos médios produtores. Ou se juntam em grupos, cooperativas, por exemplo, ou investem em nichos.

Foi o que fizeram, por exemplo, os produtores que investiram na indicação geográfica, certificação que leva em conta características naturais ou humanas do território de origem ou do processo de fabricação, com foco na qualidade e tipicidade do produto como fatores de diferenciação.

São produtos com identidade e valor próprios e únicos, com atributos exclusivos em função de recursos naturais, clima, solo, modo de fazer, fatores culturais e relacionados a tradições.

Fazem parte desta seleta lista, o cacau em amêndoas de Linhares (ES); a cachaça de Paraty (RJ) e de Salinas (MG); o café do Cerrado Mineiro, da Serra da Mantiqueira (MG) e do norte paranaense; o camarão da “Costa Negra” (CE); a carne bovina do Pampa, o vinho do Vale dos Vinhedos e o arroz do litoral, todos do Rio Grande do Sul; o queijo do Serro e da Canastra, ambos em Minas Gerais; entre tantos outros. À medida que a renda cresce, o consumidor vai demandar, além de maior quantidade, variedade e quantidade de alimentos.

O produtor rural precisa refinar sua percepção acerca das demandas dos consumidores, e as empresas precisam compreender que o produtor precisa ser tratado como parceiro, com uma renda adequada ao peso do seu papel. E o governo? Ah, o governo precisa qualificar o seu trabalho diplomático, investindo em mais inteligência comercial. Mas isso é tema para futuras colunas.


Fonte: Revista AgroANALYSIS por Cesario Ramalho da Silva, presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB)

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